
Fotos: Alcione Guimarães e Parque zoológico de Goiânia

Elizabeth Caldeira Brito
Dentre as várias formas de comunicação artística, Alcione Guimarães identificou-se inicialmente com as artes plásticas. Após concluir o curso de Direito, na Universidade Católica de Goiás, dedicou-se à pintura. Fez curso livre desta técnica e de desenho na Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Goiás. Aprendeu com os mestres Frei Nazareno Confaloni, DJ Oliveira e o ídolo de muitos, Amaury Menezes. Aprimorou com DJ Oliveira sua visão de arte. Há muito optou pela carreira de pintora. Recebeu várias premiações em concursos, salões e bienais. Dentre as exposições individuais, merece destaque a realizada na Fundação Nacional de Arte – Funarte – SP.
Mas aqui, a proposta é abordar outro pedaço, outra voz de sua vida ávida por extrapolar os limites do dizível: o seu fazer poético. A poetisa chega inesperadamente. Vem expor os sentimentos que transcendem palavras, recurso limitado que utilizamos. Chega, como quem vem para ficar: com leveza e fluidez, tal qual um suave vento, no lusco-fusco de uma outonal tarde goiana. Comunica-se em dupla linguagem artística: a poética e os quadros-poemas, como denomina suas pinturas no livro de estreia - Zuarte. Surpreende-nos com líricos e consistentes poemas, esculpidos em sintonia com as telas. Precedendo as pinturas, invadem-nos, dos olhos à alma, em múltiplos estímulos:
IV
“Olha uma tênue luz
se abisma através da vidraça
como um anjo etéreo.
Sobre a mesa,
duas laranjas
breves e solenes,
vermelhas e serenas.
E esse silêncio –
denso rememorar
de ácidos e doces
sentimentos secretos.”
O poeta Rainer Rilke afirma que, para se produzir uma obra de arte, é necessário ensimesmar-se e examinar as profundidades de onde jorra a vida; na fonte desta é que o escritor encontrará a resposta à questão de saber se deve ou não produzir sua literatura. Alcione mergulha e, ao emergir de seu molde, figura plural e singela, arranca e extrai a vida. Traduz urdiduras vividas. Expõe, para a eternidade, efêmeros diálogos da existência humana, em variedade de riquezas metafóricas e místicas reflexões:
VII
“No enlevo do enredo
ao desvelo da trama
novelo.
Na linha
da vida,
na lida
das mãos,
repasso meus sonhos.
Do fio à urdidura,
caminho meu rumo.
Só Deus sabe.”
Paul Klee pondera: “não cabe ao artista reproduzir o visível, mas tornar visível o que ainda não é”. Ao se expressar, Alcione Guimarães assusta intimidades e assume, com a pintura e a poesia, a responsabilidade de tornar visível o que ainda não o é. Gestora do verso e da tela, repercute inquietações que a habitam, comuns ao mundo que a cerca. Surge assim uma nova e melodiosa voz, para o alcance do objetivo original da arte: expressar o espírito humano, neste nosso nem sempre bem habitado planeta poético.
Namastê.