Elizabeth Caldeira Brito

Elizabeth Caldeira Brito
Casa de Campo em Alhué - Chile. Fotografia de Elciene Spenciere

Quem sou eu

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Goiânia, Goiás, Brazil
Elizabeth é Psicóloga, Professora de Educação Física e escritora. Sócia Titular-Cadeira 07 do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás. Membro da Academia de Letras do Brasil. Diretora Regional do InBrasCI - Instituto Brasilieiro de Culturas Internacionais. É Conselheira do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de Goiânia. 2ª vice-presidente da Comissão Goiana de Folclore-UNESCO. Obra: Dimensões do Viver, poesias - 2004; Quatro Poetas Goianos e um Pintor Francês, biografias - 2004; O Avesso das Horas & Outros - El reverso de Las Horas y Otros - L'Envers des Heures & Autres, Edição Trilingue, poesias - 2007.Traduções de Yvan Avena (para o idioma francês), Perpétua Flores e Ana Maria Patrone (para o idioma espanhol). A cultura plural de Bariani Ortencio (org) Kelps, 2009. A vinda da Família Real para o Brasil-200 anos (org.)Kelps, 2009. Permanências , artigos, Kelps/UCG -Goiânia 2009.Santuário da Cultura Universal, ensaios, Kelps - Goiânia, 2010. Amayáz, poesias, Kelps, 2012. Formação de Goiás Contemporâneo, (org) artigos. Kelps, 2013. FOTOGRAFIA DE MONIQUE AVENA

POESIA

                               A Persistência da Memória - Salvador Dali



O AVESSO DAS HORAS


Teço o que sou
no vazio dos dias.
Sigo no avesso relógio ao c
                                      o
                                 n
                            t
                       r
                 á
           r
       i
  o
.
O tempo tem seu tempo contado,
faz do sonho o inimaginável.
Há quem responde a completude do ser,
senão às horas, aos dias, ao tempo
e à angústia de viver?
O ser ressurge
do sêmen que à vida jorrou.
E o criador fez a criatura
viver infeliz abismos noturnos.
Sequer importa a vida lá fora,
acorda a morte prematura.



Parque Vaca Brava. Goiânia - Goiás



A POESIA

A poesia não sabia
ser possível sentir
o que a movia.
Fez-se o dia!
Foi-se o lençol
que inteira a cobria.
Tornou-se verdade.
Seu rastro agora
é só realidade.



                                       Flor de cacto (Foto: Elizabeth Caldeira Brito)


AFETO

O universo
colocou-me às mãos
todo seu afeto.
Recolho.

Assim o preservo.
Até que o mito
se faça homem.

Tão perto,
que todo o afeto
do universo
tem agora
o seu destino.




Parque Ecológico. Goiânia - Goiás


BIPOLAR


O kamikaze
mergulha
em vôo errático,
no vale da morte.
 
E fica, enquanto
a sombra do que é
permanece.

E quando a vida
revés retorna,
emerge para
o outro pólo.

Então sorri,
da desgraça de si.

Assim vai vivendo
mar adentro,
procurando o caminho,
o equilíbrio, o centro.





DUALIDADE
                                                                                                          
                                                                           Desenho-Yvan Avena

A poesia
no assombro da noite,
esfacelou-se.

Há a que se expõe
nas palavras, linhas
e metáforas
na distância das horas.

Há a que se esconde,
sob o pulso
que a(r)dia
sonho, prazer
e fantasia.
                                                                                          
Uma anoitece,
sem forças em conter-se,
para a outra conseguir
subviver.

                                                                                                                       

EM PELE


Remete o sentir à própria vida
afeito ao âmago amargo
da solidão compartilhada,
em intensas metades.
Pleno em sentimento.
Inteiro em saudades.

Remete o corpo à própria vida,
trêmulo e desajeitado,
cálido e alegre,
se guardava em pele.
Celebra amaravida,
que não mais será singular.


MELIPILLA


É tempo de plenitude,
completude e emoção.
Não acorde o sonho.
Pise leve as estrelas.
Silenciem as nuvens.

Se é possível
continuar sonhando...
Onde dormir para sempre?





Tela de Di Magalhães


EMPATIA

Vem aprender-me:
retire dos olhos
as vendas adâmicas.

Afaste as máscaras
que reflete em mim.
Coloca-te onde estou.
E vê,
com os olhos
de minha alma,
todo o universo.

Aprenderá assim,
de infinita forma,
o Eu de mim.



FOME


Nenhum alimento
sacia a fome
do amor ausente.
O ser se consome.
Resta um resto
de saudade.


                                                      Leveza em cactos (foto de ECB)


ENTREGA

Êxtases partilhados
com tua ausência.
A dependência
do não ser,
querendo teu ser.
As noites buscam o sol
que chega lentamente.
Os olhos ao léu
vêem noites infindas.
E no breve amanhecer
tudo se torna claro,
senão o sentimento.
Vem o recomeço:
o sedento e gostoso
tormento
de se adolescer,
da espera virtual,
do prazer à distância
e do calor infernal
de querer ser teu ser.
Não. Não consegue!
Entrega-se
ao vulto que vê
sem que jamais
tenha visto.


                                                     Monumento em Goiânia - Goiás

FINADOS

Parabéns a você
que morreu para mim.

E como matar o que está na pele,
na história, na retina e na memória?

Volte!
Antes que eu morra
de amor por você.


                                                  Parque Zoológico. Goiânia - Goiás


NADA

Não mais fim de semana,
nem lindo amanhecer.
Não mais águas de março,
só estar com você.

Não mais pôr-do-sol,
nem chuva na plantação.
Não mais eclipse lunar,
nem luar do sertão.

Não mais brisa da manhã,
nem leve sopro do vento.
Não mais olhar as estrelas,
nem o melhor pensamento.

Não quer mansidão das águas,
nem o silêncio da mata.
Só saciar a fome,
na solidão que desata.



Tela: Di Magalhães


NOSTALGIA


Saudade,
já não cabe em si.
Evola nos poros.
No sombrio olhar
se deixa ficar.

No soluço da alma
plangia ausência.
Não disfarça a efígie:
fantasma de um
que o outro não tem.

Saudade,
camufla alegria,
contagia tristeza,
suprime euforia.

De quem outrora,
por não ser assim
era tão infeliz!




ONTEM


Olvidar um ontem
apagar à vida o dia
que se quedou na memória,
na veia e na trajetória.
No entristecer do sol
ao ver a noite invadir seu dia.

E o dia que finda
sem o anoitecer:
perdura na dor,
angustia e solidão,
companheiras dos ontens
e dos amanhãs
que virão.


                                                                                                        Foto ECB


POSSESSÃO


Quisera apagar de ti
a luz e o sol
que irradias,
para retirar
as sombras
que te acompanham.



                                       Foto ECB

PALAVRA


Imersa à infância
traduz o Outro ser.
O sentido é imposto:
significa o que o Outro
indivíduo quer dizer.

Palavra de então,
que ainda não se crê:
transporta o que é de si
em signo do além,

congela a realidade,
reforça preconceitos.
Som que silencia
a história que contém.

Palavra que liberta
as sementes da fala.
Quando mais germina,
quanto mais se cala.


Desenho Yvan Avena


PLATÔNICO


Beija os cabelos
como se fosse irmã,
a face, se fosse filha,
a pele, se fosse mãe.
Beijos que não queria.
O desejado:
de ser amado,
nos lábios molhados
no revelar da paixão.



Foto ECB


STRIP-TEASE


Fiz strip-tease dos verbos
que me vestiam,
para cobrir-me
em tatuagens,
das incríveis
viagens de tuas
mãos.



RETIRANTE
                                                                                  Ao escritor Aidenor Aires

A cidade vazia
metrópole fria,
soluça a ausência
do menino amado.

Debandando a fome,
no sacolejo dos dias,
buscou outro rumo.
Buscou outro estado.

Na cidade aporta.
Medrando em labuta,
em rol de palavras,
é lesto adotado.

E àquela que um dia,
foi berço esquecido,
agora em alforria,
retorna em vitória.

A cidade vazia
especa, aguarda
o retorno de seu
menino de glória.


Bosque dos Buritis. Goiânia- Goiás


SER E ESTAR


Estou
entre o Meia-Ponte
e o ser,
que à mão ampara
o que não se alcança.

Estou
entre o nume
e a mente.
E o gesto que se quer
só se compreende.

Estou
entre o platônico
e o lascivo.
E a libido que une
não nos liberta.



Goiânia-Goiás


TENTATIVA


Tento juntar pedaços
da metade que restou,
vou tateando a pele
para matar a saudade
da saudade que ficou.

Tentativa em vão!
A pele percebe,
que nesses braços
não estão tuas mãos.


Foto ECB


EXPERIÊNCIA


O canto de um ser plural,
guardará indelével,
os amanhãs que chegam,
à sombra daqueles
estagnados,
no avesso das horas.

Cravada na geografia dos rios
da correnteza do sangue,
nos fios de memória
que guardam o lume
das claras manhãs.
A vida celebra.

E ao inexistir
a cal desses dias,
haverá de estar
para além do fim,
a experiência.




TÍMIDA OBSSESSÃO


Quero ser

bola que te embala o ânimo,
o mel que te adoça o beijo,
a língua que te faz a fala,
e o seu som, que encanta almas.

Quero ser

a luz que de ti emana,
o vento que te roça e fere,
o ar que em ti entranha,
o suor que te aflora à pele.

Quero ser

o lençol que te embala o sono,
o sonho que povoa o espírito,
a imagem que guarda a retina,
o chão que te pisa os pés.

Quero ser

o rio que te banha o corpo,
a palha que te guarda o sol,
a água que te bebe a sede,
e a sombra que te segue sempre.







O TEMPO



Procura-se
nas horas lentas,
consumidas em ilusões
e esperanças de única via.

Procura-se
nos nebulosos dias,
o brilho do olhar,
que no assalto do tempo,
vestiu-se baços
e opacas neblinas.

Procura-se
no campo invisível
do silente desejo,
o instante de sonho,
que só o tempo ensina.

E vislumbrando manhãs
de viagens infindas,
em horas amargas
e inválidos dias,
do tempo que urde
a singular figura.

E constrói para sempre
uma infeliz criatura.



                                                     Bosque dos Buritis. Goiânia - Goiás


Da-me a mordaça
se necessita palavras.
Ata-me os passos
e descaminho em veredas.
Da-me a solidão
e expõe-me à vida.
Ata-me o gesto
ao jogar-me ao mar.

È assim que reside
um ser singular.





A SE CONSUMIR




A noite
não finda,
sagra a ausência
que povoa a mente.

A espera,
se consome em sonho,
no afã do encontro
inteira se oferta.

O tempo
da segura incerteza,
no piscar de olhos,
uma chama ilumina.

Não para si,
na vela acesa.



                                                          Parque Zoológico. Goiânia - Goiás


INSTANTE


Impedir
que o momento
passe em relâmpago.

Segurar
o instante
que reflete no olhar
a imagem almejada.

Te c e r
palavras que traduzem
o que o corpo em vão,
tenta emudecer.

Ocultar
os desvelados
segredos, inscritos
em cada poro
e no pulso acelerado
da emoção comedida.

Traduzir
ocultas idéias
e metáforas.

Desvendar
o que está
à frente dos olhos,
ao alcance das mãos.






CARNAVAL

Na poeira de só
que emana dos pés,
o eterno encanto
desfaz-se em instantes.
No disfarce das horas,
queda a fantasia.
No efêmero tempo,
quarta-feira em vida,
se veste de cinzas.
Resta o que seria.



Os textos anteriores são do livro
O avesso das horas & outros. El reverso de las horas y otros.
 L'envers des heures & autres - edição trilingue.
Tradução para o espanhol de Perpétua Flores e
para o francês de Yvan Avena, responsável pelas ilustrações dos poemas